De acordo com uma pesquisa realizada pelo Grupo Iaudit, entre os anos de 2021 e 2022, 48% dos relatos feitos nos canais de denúncias envolvem assédio moral e sexual, abuso de poder e desvio de comportamento entre funcionários. [1]

Embora diversos estudos apontem a relação entre o bem-estar dos colaboradores e sua produtividade, é evidente que a ausência de metodologias para a melhoria da comunicação organizacional interna e até mesmo a falta de inteligência emocional por parte dos gestores e colaboradores de diversos segmentos prolonga a cultura do assédio na sociedade.

Para Marie-France Hirigoyen, especialista no assunto, o assédio moral no trabalho consiste em toda e qualquer conduta abusiva que atende, por repetição ou sistematização, contra a dignidade ou integridade psíquica ou física de uma pessoa, ameaçando seu emprego ou degradando o clima de trabalho.²

A cultura do assédio encontra aval de diversos setores como uma prática generalizada em instituições que acreditam que certas condutas abusivas podem ser justificadas sob o prisma do desempenho e para manutenção organizacional. Nesse sentido, o assédio moral institucional ocorre quando a própria instituição se utiliza de estratégias desumanas, criando modos de organização do trabalho propensos a um ambiente hostil.

Por outro lado, existem casos em que o assédio ocorre de forma interpessoal, isto é, de forma direta, com a finalidade de prejudicar ou constranger o profissional individualmente. Previne-se que essas práticas podem ocorrer, inclusive, entre empregados que possuem o mesmo ou semelhante nível hierárquico.

O presente artigo visa a discutir especificamente os casos em que há pessoalidade na ocorrência do fato. É nítida e constitucional a responsabilidade empresarial na manutenção de um ambiente de trabalho saudável. Contudo, ainda cabe questionar a função punitivo-pedagógica da indenização no autor da ocorrência.

Da obtenção de provas e a responsabilização pessoal

De acordo com dados do TST (Tribunal Superior do Trabalho), em 2021 mais de 50 mil ações foram ajuizadas com pedidos referentes a indenizações por assédio moral. Em um primeiro momento, cabe destacar que o ônus da comprovação do assédio pertence ao empregado, nos termos do artigo 818, I da CLT e 373, I do CPC. Assim, tratando-se de uma situação individual, o empregado necessitaria de mais do que meras alegações para a comprovação do ato.

Nesse sentido, na Justiça do Trabalho, a prova testemunhal tem sido a mais utilizada para os casos em que o constrangimento ocorreu de forma pública, embora também poderiam ser gravações, mensagens ou outros documentos, quando o caso ocorreu sem a presença de outras testemunhas.

O assédio pode ser ainda discriminatório, demonstrando uma distinção com base no gênero, orientação sexual, crença religiosa, política, cor ou até mesmo uma deficiência, o que justificaria, além de uma ação trabalhista, o ajuizamento de uma ação penal.

Pela exposição frequente ao estresse, de acordo com dados do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), os transtornos mentais podem ser considerados a terceira maior causa de afastamento do trabalho no país.

O que se observa na prática, no entanto, é que, após o encerramento do contrato, muitas vítimas preferem prosseguir com a ação apenas em face da empresa e visando a uma indenização, sem se envolver diretamente em uma situação jurídica com o assediador, por entenderem ser da empresa a obrigação de promover uma consequência jurídica.

Os números mostram, por outro lado, que as ações de regresso pelas empresas em face dos casos de assédio comprovados são absolutamente menores do que as ações indenizatórias ajuizadas, sendo comum que os funcionários que praticaram o assédio, inclusive, permaneçam no mesmo cargo por análises de produtividade ou tempo de atividade, sem qualquer alteração no fluxo organizacional.

É mister que se há um gestor ou colaborador abusivo com os colegas de trabalho e que conduz sua eficiência com base em uma comunicação violenta ou até mesmo discriminatória, outras situações jurídicas podem surgir, e a empresa poderá ter outros passivos.

Nesse sentido, destaca-se a decisão da 8ª Turma do TST, que manteve a condenação em uma ação de regresso contra um ex-gerente de vendas condenado a ressarcir a empresa pelos valores pagos a seus subordinados vítimas de assédio moral comprovada em diversas ações individuais.

Dessa forma, veja-se que o direito de regresso por parte do empregador não afasta o princípio da alteridade e não fere ao artigo 2º da CLT, sendo completamente compatível com a teoria do risco do empreendimento a responsabilização pessoal do agente do fato.

Cabe ainda explicitar que a empresa sempre será a mais exposta a possibilidade de reparação civil, uma vez que a responsabilidade do empregador pelos atos de seus empregados, nos termos do artigo 932 III do Código Civil, decorre tanto de atos contra outros empregados, quanto contra qualquer outra pessoa, como um cliente ou fornecedor.

Nestes termos, sempre que o assédio moral ocorrer por qualquer de seus empregados, gerentes ou prepostos, a empresa responderá por não apresentar formas de combate efetivas ao assédio no ambiente de trabalho.

Por outro lado, é evidente que a condenação da empresa ao pagamento da indenização não afasta o direito de requerer o respectivo ressarcimento do empregado que causou o dano, físico ou psicológico a outrem, especialmente quando a ação em face da empresa comprovar que o ato ocorreu de forma dolosa.

Assim, previne-se que, embora ainda existam muitos desafios para a comprovação do assédio no âmbito trabalhista, o combate ao assédio deve começar no monitoramento interno das próprias instituições, o que as permitirá identificar o fato com mais facilidade e construir um ambiente que respeite os direitos de personalidade, isto é, os elementos físicos, psíquicos, morais e intelectuais de seus funcionários.

Medidas internas

Uma prática frequente nas instituições em que há assessoramento jurídico interno vem sendo a divulgação e instituição do código de ética e de um termo de responsabilidade assinado pelos colaboradores enfatizando os princípios organizacionais de boa convivência e comunicação assertiva, além da ciência da possibilidade de responsabilização pessoal pelos danos causados a outros funcionários.

Interessante observar que, embora seja recomendado para toda a estrutura organizacional, é imprescindível que os gestores prioritariamente tenham treinamentos, participem de palestras, oficinas e tenham o devido suporte para que sejam incentivadas as boas relações no ambiente de trabalho, com tolerância à diversidade de perfis profissionais, além da possibilidade de avaliação psicossocial de seus subordinados.

Nesse sentido, em 2022, a Lei 14.457 estabeleceu que uma das novas resolução das comissões internas de prevenção de acidentes deve ser o combate ao assédio moral e sexual no ambiente de trabalho. Dessa forma, a legislação visou a demonstrar a importância das ações de capacitação, orientação e sensibilização dos empregados quanto ao tema.

Não o suficiente, o estabelecimento de canais de recebimento e protocolos de denúncias pelo empregador é primordial para o desenvolvimento de medidas internas capazes de promover a resolução dos casos antes que se tornem passivos trabalhistas.

Por meio de um canal de denúncias, os funcionárias podem se sentir seguros para expor situações irregulares, a fim de que sejam indicadas possibilidades para a solução do problema ou para que sejam encontrados os responsáveis por eventual ato ilícito.

Crédito e fonte: Consultor Jurídico.

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