No último dia 9 de dezembro, o senador Eduardo Braga apresentou seu parecer sobre o Projeto de Lei Complementar nº 68/2024, que regulamenta a reforma tributária implementada pela Emenda Constitucional nº 132/2023.
Entre os instrumentos previstos na reforma tributária, destaca-se o imposto seletivo (IS), que incidirá sobre bens e serviços considerados prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente, como veículos, embarcações, aeronaves, produtos fumígenos, bebidas alcoólicas, bebidas açucaradas e bens minerais. Com uma abordagem regulatória, o imposto busca corrigir externalidades negativas, desestimular o consumo de itens nocivos e promover práticas mais sustentáveis na economia.
Este artigo propõe uma breve reflexão sobre como o referido imposto impactará a competitividade industrial no setor de bebidas, um dos segmentos mais sensíveis às alterações regulatórias.
Partindo da perspectiva da análise econômica do direito e da teoria da taxa pigouviana, busca-se compreender como o IS pode influenciar o comportamento dos consumidores, estimular a inovação no setor e desafiar as empresas a equilibrar eficiência econômica com responsabilidade socioambiental.
IS e suas funções regulatórias no setor de bebidas
Conforme adiantado, o IS, introduzido no âmbito da reforma tributária brasileira, é um tributo extrafiscal projetado para desestimular o consumo de produtos associados a impactos negativos à saúde pública e ao meio ambiente.
Fundamentado no artigo 153, VIII, da Constituição, o IS reflete uma tentativa de alinhar a política fiscal a objetivos regulatórios mais amplos, indo além da mera arrecadação.
Sua aplicação sobre o setor de bebidas abrange diversas categorias, incluindo alcoólicas e açucaradas, reconhecendo as externalidades negativas relacionadas a esses produtos.
No caso das bebidas alcoólicas, por exemplo, o imposto é desenhado para incidir de forma progressiva, considerando o teor alcoólico e o volume. Essa abordagem visa desencorajar o consumo de bebidas com maior concentração de etanol, como vodcas e destilados, ao mesmo tempo que adota uma tributação mais leve para bebidas com menor teor alcoólico, como cervejas.
No que tange às bebidas açucaradas, o IS busca não apenas reduzir o consumo excessivo de açúcar, mas também promover a reformulação de produtos pela indústria.
Com isso, o IS se apresenta como um tributo com múltiplas funções regulatórias. Ele não apenas desestimula o consumo de produtos considerados prejudiciais, mas também incentiva a adoção de práticas mais sustentáveis e responsáveis.
Impactos econômicos e comportamentais do IS no consumo de bebidas
Em razão do caráter desestimulador, o IS exerce influência direta nos padrões de consumo ao ajustar os preços relativos de bens considerados prejudiciais, como bebidas alcoólicas e açucaradas.
Baseando-se na elasticidade-preço da demanda, essa política parte do princípio de que o aumento no custo de um produto desestimula sua aquisição, especialmente quando se trata de bens não essenciais.
Não obstante os efeitos imediatos sobre o consumo, o IS induz mudanças comportamentais mais amplas. O aumento nos preços faz com que os consumidores reconsiderem suas opções, buscando alternativas mais acessíveis e nutritivas.
No caso brasileiro, onde a elasticidade-preço das bebidas açucaradas indica uma sensibilidade significativa a variações de custo, espera-se um impacto semelhante, com potencial para reduzir os índices de doenças relacionadas à má alimentação.
No entanto, as respostas do mercado, como a reformulação de produtos para reduzir o teor de açúcar ou o desenvolvimento de estratégias promocionais para suavizar o impacto nos consumidores, devem ser acompanhadas de perto.
Desafios e críticas ao impacto do IS no setor de bebidas
A implementação do IS apresenta desafios importantes para a indústria de bebidas, como a necessidade de adaptação a custos adicionais e mudanças no comportamento dos consumidores.
Ademais, o imposto seletivo também suscita questionamentos sobre sua efetividade como ferramenta regulatória. Embora seja justificado por sua capacidade de reduzir externalidades negativas associadas ao consumo de bebidas alcoólicas e açucaradas, há indícios de que os efeitos desejados podem não ser alcançados de maneira uniforme.
Um dos principais desafios enfrentados pela indústria é a sensibilidade dos consumidores ao aumento de preços, que pode levar à queda no consumo de produtos sujeitos à tributação. Essa elasticidade-preço, por outro lado, pode gerar distorções, como a substituição por outros produtos igualmente calóricos ou prejudiciais que não estão sujeitos ao Imposto Seletivo.
Ainda, a aplicação do IS pode ser alvo de críticas quanto ao seu potencial regressivo, já que o aumento nos preços tende a impactar de forma desproporcional as famílias de menor renda. Essas famílias podem se ver obrigadas a reduzir o consumo de itens tributados ou destinar uma parcela maior de sua renda para mantê-lo, o que pode ampliar desigualdades sociais.
Para a indústria, isso pode significar lidar com mudanças imprevisíveis na demanda, ao mesmo tempo em que enfrenta eventuais críticas sobre o impacto distributivo da medida.
Por outro lado, o IS pode criar oportunidades para inovação no setor de bebidas. A reformulação de produtos para atender a novas exigências regulatórias, como a redução do teor de açúcar ou álcool, pode ser uma estratégia competitiva em mercados cada vez mais preocupados com saúde e sustentabilidade.
Não obstante, essa transição requer suporte regulatório consistente e previsível, bem como políticas que incentivem investimentos no desenvolvimento de alternativas mais saudáveis.
Considerações finais
O IS surge com o objetivo de enfrentar desafios relacionados à saúde pública e à sustentabilidade, corrigindo falhas de mercado e incentivando escolhas de consumo mais responsáveis.
Embora apresente potencial para reduzir o consumo de produtos prejudiciais e estimular a inovação, sua efetividade depende de um desenho de política que leve em conta fatores como a elasticidade-preço, as respostas do mercado e os impactos sociais da tributação.
Por fim, sua implementação deve estar integrada a um conjunto mais amplo de estratégias, combinando tributação com incentivos à sustentabilidade e ações educativas, possibilitando avanços em saúde pública, inovação e responsabilidade fiscal.
Créditos: Conjur